O futuro da privacidade na Europa poderá depender de um só país. Com a votação da regulamentação do chamado ‘Chat Control’ da União Europeia a aproximar-se em Outubro, a posição da Alemanha poderá determinar se as comunicações encriptadas se mantêm protegidas ou se UE avança para um modelo de vigilância intensiva que expõe mensagens privadas, fotos e ficheiros ao escrutínio governamental.
A Tuta Mail disse que vai processar a União Europeia caso a proposta de regulamentação ‘Chat Control’ seja aprovada em Outubro de 2025. O serviço de email encriptado diz que a medida é uma ameaça sem precedentes à privacidade e segurança. Avisa que a lei exigiria que os fornecedores de serviços analisassem todas as mensagens privadas, fotos e ficheiros – mesmo os protegidos por encriptação ponto a ponto – o que se traduziria numa vigilância imposta pelo governo. A lei poderia forçar os serviços encriptados a comprometerem os seus protocolos ou a saírem da UE. A Tuta vê a proposta como um ataque directo tanto à privacidade dos utilizadores como à sobrevivência de empresas focadas na privacidade.
Formalmente conhecida como “Regulamento do parlamento europeu e do conselho que estabelece regras para prevenir e combater o abuso sexual de crianças”, foi proposta pela primeira vez pela Comissão Europeia em Maio de 2022. O objectivo declarado é combater a propagação online de material relacionado com o abuso sexual de crianças. A regulamentação exige que os fornecedores de serviços de email, mensagens instantâneas e cloud detectem e denunciem conteúdos ilegais. Os mecanismos de aplicação incluem a análise no lado do cliente, o que significa que o software instalado nos dispositivos dos utilizadores verifique as mensagens antes de serem encriptadas.
Os críticos argumentam que a proposta compromete a encriptação ponto a ponto, expõe milhões de comunicações privadas a uma potencial vigilância e poderá violar os direitos fundamentais de privacidade garantidos pela Carta dos Direitos Fundamentais da UE (documento EDRi). Segundo relatos, os conselheiros jurídicos da União Europeia descreveram o projecto como desproporcionado e com poucas probabilidades de resistir a uma decisão judicial, e até agora, a regulamentação tem de facto tido dificuldades em ganhar apoio.
De acordo com o site TechRadar, a proposta continua em debate no Conselho da UE, com uma votação provisoriamente agendada para 14 de Outubro de 2025. A presidência dinamarquesa está actualmente a pressionar pela sua aprovação, mas vários estados-membros, incluindo a Alemanha, a Eslovénia e a Estónia, ainda não tomaram uma posição clara. No meio desta incerteza, a Tuta tem-se manifestado publicamente sobre o impacto da lei nos serviços encriptados.
O CEO da Tuta, Matthias Pfau, disse que a lei forçaria fornecedores de serviços a escolherem entre enfraquecer a encriptação ou deixar a UE.
“Para nós, é um paradoxo que o governo alemão nos tenha concedido 1,5 milhões de euros para desenvolver uma solução de correio electrónico com encriptação pós-quântica, e agora os políticos da UE querem destruir este alto nível de segurança com a legislação Chat Control”, diz Pfau numa publicação recente no blogue da Tuta.
Pfau criticou ainda as excepções da regulamentação para comunicações governamentais e militares, dizendo que a lei vigiaria os cidadãos comuns enquanto protege os dados do estado. O CEO descreveu a lei como “vigilância em massa disfarçada de protecção infantil” e avisou que poderia permitir que algoritmos de IA opacos marcassem mensagens e fotos privadas sem supervisão ou mandatos judiciais.
A Tuta posicionou-se como defensora da privacidade digital e da encriptação, e a empresa diz que está preparada para contestar a regulamentação em tribunal, se necessário. Os tribunais alemães têm historicamente anulado medidas de vigilância desproporcionadas, incluindo leis de retenção de dados, o que sugere que o Chat Control poderá enfrentar desafios jurídicos semelhantes. A Tuta afirma que lutará contra a lei em tribunal em vez de enfraquecer a sua encriptação, avisando que a sua aprovação minaria o equilíbrio entre a vigilância estatal e a privacidade individual na Europa.