Numa medida que promete reacender o debate sobre a privacidade digital versus a segurança infantil, o governo do Reino Unido vai “encorajar” a Apple e a Google a impedir que os telemóveis apresentem imagens de nudez, excepto se os utilizadores comprovarem através de identificação biométrica que são adultos. Segundo uma reportagem do Financial Times, esta iniciativa visa combater a violência contra mulheres e raparigas e proteger menores de conteúdos explícitos.
Embora, para já, a medida não seja apresentada como uma exigência legal, o executivo britânico vê este pedido como um primeiro passo. A estratégia passa por convencer os detentores dos sistemas operativos móveis a incorporar “algoritmos de detecção de nudez” directamente no software dos dispositivos. O objectivo é impedir que os utilizadores tirem fotografias ou partilhem imagens de genitais, a menos que tenham verificado a sua maioridade através de dados biométricos ou documentos de identificação oficiais.
O fim do anonimato no ecrã?
Se a vontade do governo britânico prevalecer, o iOS e o Android passariam a ter um papel activo de censura prévia, bloqueando qualquer nudez no ecrã por defeito. O plano inclui ainda regras mais estritas para condenados por crimes sexuais contra menores, que seriam obrigados a manter estes bloqueios activos permanentemente.
Esta pressão para um bloqueio ao nível do dispositivo surge na sequência da implementação da Online Safety Act no Reino Unido. Embora esta lei já obrigue as plataformas de pornografia e redes sociais a verificar a idade dos utilizadores, as autoridades reconhecem que a medida é falível, uma vez que muitos menores utilizam serviços de VPN para contornar as restrições geográficas e aceder aos sites. Ao transferir a detecção para o próprio telemóvel, o governo espera fechar essa lacuna.
Preocupações com a privacidade e precedentes
A proposta levanta sérias questões sobre direitos dos utilizadores e privacidade. A implementação de varrimentos constantes ao conteúdo do telemóvel recorda a polémica de 2021, quando a Apple anunciou planos para analisar as fotografias nos iPhones em busca de material relacionado com pedofilia (CSAM). A reacção negativa de defensores da privacidade foi tão intensa que a empresa de Cupertino acabou por abandonar o projecto.
Além disso, a eficácia e a precisão destes algoritmos de detecção automática continuam a gerar discórdia. Tanto a Apple como a Google já oferecem ferramentas de controlo parental opcionais, mas historicamente opõem-se a mandatos que possam comprometer a encriptação ou criar backdoors para vigilância governamental. Com batalhas legais sobre verificação de idade já a decorrer no Texas e na Austrália, este movimento do Reino Unido sugere que a tensão entre regulação estatal e as tecnológicas está longe de terminar.