Em Maio assisti a uma emergência hospitalar crítica. Felizmente, não foi comigo (podia ter sido com qualquer um de nós), mas tratou-se de uma falha técnica de um equipamento vital para um bloco operatório. Mesmo com soro a correr-me nas veias, vestido com uma bata bastante ridícula e muito pouco “fashionable”, dei por ela quando a agitação começou a propagar-se pelos corredores.
Nenhum pânico, apenas um nervoso perceptível no rosto dos profissionais. Ando cá há demasiado tempo para conhecer o odor a torradas, sobretudo em locais hospitalares onde não há torradeiras. «Ui», terei pensado: «Condensadores queimados…». Olhei para as linhas de soro penduradas, endireitei-as e pensei «Pedro, é hoje que vais fugir de um hospital levando contigo o soro e vestido de forma bastante ridícula…». Não foi necessário. Uma equipa de intervenção entrou em acção, substituiu em minutos o equipamento defeituoso e a vida prosseguiu mansa, tão mansa quanto possível dadas as circunstâncias.
«Abençoada redundância…». Este pequeno episódio abriu-me outras memórias recentes referentes ao apagão. E à questão da redundância tecnológica pessoal. Sou do #teamkit, fui escuteiro, não receio a adaptação e estou em crer que ainda conseguirei sair para caçar, sem ser no hipermercado. A verdade é que o apagão me mostrou que não estou nadinha preparado para sobreviver em caso de cataclismo (os meus conhecimentos de Morse são grandes, mas duvido que o mundo me entenda…). A verdade é que estou protegido até deixar de haver comunicações electrónicas, depois disso é o salve-se (literalmente) quem puder.
Este acontecimento fez-me rever quase tudo em termos de energia, mas levanta-me tantas questões, que me perguntei, por vezes, se me estava a preparar para o Apocalipse. Tenho alguns amigos que, no interior do País, se atiraram de corpo e alma à experiência “off grid”, ri-me de alguns deles mas já escrevi a outros tantos a pedir relatos de algumas das soluções que adoptaram. Vivi parte da minha vida sem comunicação imediata, mas hoje tenho dúvidas se não entro em carência física ao fim de umas horas.
Passei parte do tempo do apagão a dormir uma bela sesta, coisa que não fazia há algum tempo, e que duvido que consiga fazer face a um alegado “fim do mundo”. Ri-me inúmeras vezes quando carreguei em interruptores mortos e quando tentei tirar cafés de máquinas sem vida. A mensagem que mais vezes escrevi naquela tarde foi ‘teste’. Sem salvação.