Os 2%

Por: Alexandre Gamela
Tempo de leitura: 3 min

Os putos já não querem ser astronautas, só querem ser estrelas. Do YouTube. Desculpem, sou uma pessoa avançada na idade: do TikTok. A vontade de ser famoso é perfeitamente normal, só que, se antes essa fama vinha de ser actor, músico ou desportista, agora é a fama pela fama. Obrigado, Kim Kardashian.

A democratização dos mecanismos de produção de conteúdo e a sua facilidade de distribuição (tradução: ‘toda a gente tem um smartphone com câmara e apps de redes sociais’) dão a ideia de que é fácil criar um público. Mas, como qualquer youtuber ou influencer de sucesso poderá dizer, a luta é constante.

A Natureza do meio não permite um minuto de descanso, porque a competição pela atenção é feroz e a atenção é que paga as contas. Este público não paga a entrada no circo porque, na realidade, são o alimento das feras. Mas como explicar isso aos 30% dos miúdos entre os oito e os doze anos (dados roubados do artigo Building the Middle Class of the Creator Economy de Li Jin) que sonham ser youtubers ou tiktokers? Se não resultou com os aspirantes a actores que servem à mesa em Hollywood, não irá resultar agora.

Os números são duros: apenas 2% dos criadores de conteúdos no Patreon fazem mais que o salário mínimo americano e os músicos no Spotify precisam de 3,5 milhões de streams para ganhar o mesmo (dados, idem). Por cada Wuant há milhões de youtubers que não passam da meia dúzia de seguidores. Se o futuro se mede pela ambição dos jovens, esta geração preocupa-me.

Estes “criadores” (salvo raras excepções) apenas criam irrelevância. Servem para distrair o público enquanto as feras afiam os dentes. É a denominada ‘economia da atenção’. Os miúdos devem usar os seus canais nas redes, para desenvolver novas competências e expressar a sua criatividade, sim. Mas não alimentem sonhos de fama. Ser famoso porque sim é igual a zero.

O sonho de ser estrela das redes faz-me lembrar uma piada sobre startups: só duas em cem é que fazem dinheiro. «E isso tem piada?», perguntam vocês. 98% das vezes, não.

A mirar o espelho negro das redes sociais desde ainda antes de haver uma série de TV sobre isso.
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