Aqui na PCGuia testamos muitos auscultadores, desde os que são pensados estritamente para jogar, até aos que são pensados para audiófilos que conseguem ouvir um alfinete a cair no estúdio no meio de tema musical. A certa altura, esta grande quantidade de dispositivos, que tenho tido a sorte de poder experimentar, começou a dar-me a impressão que se tinha chegado a um ponto em que a tecnologia já estava tão madura que já não existia muito espaço para evoluir.
Uns auscultadores são essencialmente um par de micro colunas de som que estão montadas num suporte que as segura na cabeça, à altura dos ouvidos. A ligação à fonte de som pode ser feita através de um cabo ou, mais recentemente, sem fios, utilizando tecnologia Bluetooth, ou uma própria do fabricante.
Ao longo do tempo foram sendo concebidas novas formas de dar mais conforto e comodidade na utilização (como a possibilidade de se controlar a reprodução de música) e para reduzir o ruído externo. Quer através de métodos passivos (isolamento), quer através de métodos activos. Que captam o som exterior, invertem-no, e misturam-no no áudio que está a ser reproduzido nesse momento.
Nos auscultadores, as melhorias na qualidade do som normalmente resumem-se a acrescentar mais altifalantes que servem para dividir as frequências que compõem o som entre si e uma afinação mais cuidada desses altifalantes. Mas sempre recorrendo a perfis de audição que espelham a média da clientela a que a marca quer chegar.
Todas as marcas apresentam apenas estas (boas) soluções para fazerem os seus produtos. Mas uma startup australiana chamada Nura, quis fazer avançar a tecnologia de auscultadores através da exploração de uma característica que foi ignorada durante todo este tempo: a personalização da reprodução do som.
A Nura foi fundada em Melbourne, Austrália, em 2015, em 2016 fez uma campanha de crowdfunding no Kickstarter para obter financiamento para produzir e comercializar os primeiros auscultadores que adaptam a forma como o som é reproduzido às capacidades de audição de cada utilizador. A campanha foi a mais bem-sucedida de sempre de uma empresa australiana. O objectivo inicial era de 100000 dólares, no final da campanha a Nura tinha arrecadado 1,8 milhões de dólares.
Como é que isto funciona?
Como de certeza sabe, neste planeta não existem duas pessoas iguais (mesmo os gémeos idênticos podem ter muitas diferenças no que respeita à sua fisiologia), por isso, porque é que todas as pessoas deviam ouvir música da mesma forma? Aliás, ao longo da vida a forma como ouvimos também muda, deixamos de ouvir bem algumas frequências e começamos a ouvir melhor outras.
O que a Nura propõe é que os auscultadores meçam a capacidade auditiva de cada utilizador e depois, através de uma aplicação móvel, seja criado um perfil auditivo, realçando as algumas frequências em relação a outras de forma a proporcionar a melhor experiência de som possível.
Isto é conseguido através da medição das emissões otoacústicas, que são, essencialmente, uma espécie de eco que o ouvido reproduz sempre que é atingido por um som. Este método é utilizado, por exemplo, na medição das capacidades auditivas de crianças muito pequenas, que não têm a capacidade de comunicar claramente.
Os dados recolhidos pelos auscultadores são depois enviados pela aplicação para os servidores da Nura para que o perfil seja criado. O perfil fica depois guardado na aplicação e nos auscultadores.
Supostamente tudo isto faz com que o som destes auscultadores é completamente diferente de tudo o resto que já foi feito, mas já iremos.
Os Nuraphone
Por fora, os Nuraphone são muito semelhantes a quaisquer outros auscultadores de gama alta, o aro é em metal e os altifalantes deslizam em duas zonas de cada lado para poderem ser ajustados à cabeça do utilizador. Do lado direito está a entrada para o cabo USB que serve para carregar a bateria. Esta entrada tem uma forma que não é padrão, o que obriga o utilizador a comprar os cabos à Nura se alguma vez os danificar ou perder. Na loja online da empresa estão disponíveis, para além dos cabos USB Type-A, cabos USB Type-C, Lighning para dispositivos Apple e analógico com ficha jack de 3,5 mm.
Do lado de dentro os Nuraphone são diferentes de tudo o resto que já vimos, as almofadas são em silicone (normalmente são em espuma com um forro em pele ou tecido), mas há uma característica muito diferente de tudo o resto: os Nuraphone são ao mesmo tempo auscultadores ‘in hear’ e ‘over hear’. Existe uma peça que encosta na entrada do ouvido, enquanto o resto envolve as orelhas. Esta configuração é necessária porque a parte interna serve para reproduzir os tons agudos e médios e a parte de fora serve para reproduzir os graves através de um outro altifalante separado.
A razão para as almofadas serem em silicone é também para criar a primeira barreira aos sons externos, porque este material ajusta-se tão bem aos ouvidos que elimina muito do ruído que pode chegar do lado de fora. No entanto, existe também um sistema de cancelamento de ruído activo.
A Nura diz que os Nuraphone têm uma tecnologia que cria uma pequena corrente de ar junto às orelhas para que os ouvidos não fiquem tão quentes durante sessões de utilização mais longa.
Estes auscultadores podem ser utilizados sem fios, através de Bluetooth (são compatíveis com a norma APTX HD, que promete som de qualidade praticamente sem perdas de qualidade), por isso a Nura tinha de incluir uma forma de se poder controlar a reprodução de som ou atender chamadas sem ter de manusear o telefone, ou qualquer outro dispositivo que esteja a usar. A solução encontrada foi a de colocar sensores nas peças que seguram os altifalantes ao aro. Assim, através da app, o utilizador pode programar o que cada sensor faz. Por exemplo, na minha programação, dois toques no sensor do lado direito passa uma música à frente, no do lado esquerdo passa uma música atrás, um único toque no lado direito pára ou recomeça a reprodução (ou atende uma chamada) e no lado esquerdo desliga o sistema de cancelamento de ruído activo para se conseguir falar com alguém sem a necessidade de tirar os auscultadores.
Por falar em tirar os auscultadores, os Nuraphone são automáticos, ou seja, desligam-se quando são tirados e ligam-se quando são postos. Não existe num botão para o fazer.
Segundo a Nura, a bateria dura cerca de 20 horas em reprodução contínua.
Personalização
O processo de personalização é muito simples, depois de emparelhar os Nuraphone com o seu dispositivo móvel e ter instalado a app, o software mostra-lhe um assistente que o guia pelos passos da configuração. Durante o processo, os auscultadores reproduzem um conjunto de sons que servem para avaliar as capacidades auditivas e, ao mesmo tempo, gera um gráfico que vai espelhar como é que ouve. No final toca uma música com a personalização desligada. O utilizador pode então ligar a personalização para ver a diferença.
Por baixo, está um cursor que na prática serve para ajustar a intensidade do som, principalmente os graves. Se o puxar todo para a direita o graves ficam tão fortes que parece o crânio está todo a vibrar, mas se o arrastar para esquerda ele não os remove completamente, mas ficam muito mais subjugados.
A aplicação permite armazenar até três perfis diferentes.
Se estiver a utilizar os Nuraphone com outro dispositivo que não o que tem a app instalada, o perfil utilizado é sempre o último que foi escolhido.
E funciona?
Em termos de som, os Nuraphone são dos melhores auscultadores que jamais usei. O som está tão bem delineado em todas as gamas que se ouve mesmo tudo claramente e sem distorções. Embora o som seja excelente, usá-los com ficheiros MP3 é um crime, porque eles brilham mesmo é com música em formato lossless como FLAC, APE ou mesmo os WAV. Uma das coisas que prova que a personalização funciona mesmo é o facto de ninguém a quem eu dei os Nuraphone para experimentar utilizou o modo ‘Neutro’, tendo todos dito que havia melhorias claras na definição do som entre os dois modos. Quando experimentaram os perfis de outros o som também aparece de forma completamente diferente.
Para quem gosta mesmo de graves, o cursor do ‘Immersion mode’ dá uma ajudinha a senti-los da cabeça até aos pés. Pessoalmente, neste caso, no meio é que está a virtude.
A coisa de ter duas peças que ficam encostadas ao canal auditivo é estranha no início, mas essa impressão desaparece ao fim de duas ou três utilizações.
Os sensores de cada lado são um pouco sensíveis demais, porque podem ser activados sem querer se levarmos uma mão à cabeça e tocarmos num deles inadvertidamente.
Já o sistema de cancelamento de ruído activo funciona. Não é tão avançado como noutros auscultadores que já testei, mas em conjunto com o isolamento proporcionado pelas almofadas em silicone é muito competente e resulta bastante bem.
Uma das coisas que penso que a Nura devia rever numa versão futura é o estojo de transporte, porque é grande demais e um pouco incomodo de transportar.
Resta-me falar do preço. Em Portugal os Nuraphone só se podem comprar online no site da empresa (são expedidos da Europa por isso não demoram mais de 3 ou 4 dias a chegar) ou através de uma loja Amazon e embora estejam na mesma gama de preços de auscultadores da mesma gama, não lá muito baratos. Podem ser seus por €399 e incluem o estojo, um cabo USB Type-A e uma embalagem de adaptadores para a peça que fica junto à entrada do ouvido). Cada cabo extra custa €20 euros, menos o Lightning que salta para os €40.
Contacto: Nuraphone
Preço: €399