Cada vez mais longe do metal

Por: André Gonçalves
Tempo de leitura: 3 min
©Sigmund

Por incrível que pareça, a informática, e particularmente a Internet, são realidades cada vez mais alheias à tecnologia que lhes servem de base. E isso é bom porque: da mesma forma que podemos hoje conduzir um carro sem a mínima noção de mecânica, podemos também facilmente produzir um vídeo e partilhá-lo com o mundo. Este foi o factor-chave que deu lugar à revolução do que, há mais de vinte anos, se chamou ‘Web 2.0’, uma revolução que conseguiu cativar um grupo muito mais alargado de utilizadores que encaram os computadores, smartphones e consolas como caixas fechadas, que lhes permitem consumir e criar conteúdos digitais sem se preocuparem com a “mecânica” inerente a esses processos.

Isto é algo possível devido ao aumento da complexidade das máquinas que se adaptam ao utilizador, tornando-se responsivas e entregando experiências de utilização familiares e coerentes. A informação tornou-se, assim, muito mais independente dos dispositivos que originalmente a registam ou armazenam, conseguindo com isto que as tecnologias da informação se tornassem ubíquas a quase todas as actividades humanas. Com isto explodiram oportunidades de negócio, tanto em soluções de mercado verticais como horizontais, por um lado reduzindo os ciclos de desenvolvimento de produto e, por outro, criando mercados de nicho, que correspondem apenas a pequenas camadas intermédias do processo computacional.

E isso é mau, porque: a estratificação dos processos informáticos em camadas cada vez mais complexas faz com que percamos “o fio à meada” e, entre cada camada, um potencial ponto de falha, tal como numa fábrica de bolos, onde já nenhum pasteleiro conhece a totalidade da receita. Com esta forma de trabalhar parcelar abrimos também lugar a uma perda de optimização de código e, por consequência, damos lugar à obsolescência precoce dos equipamentos. Milhares de ciclos computacionais perdidos no desencadear destas camadas empurram as nossas necessidades de recursos computacionais muito além do que efectivamente seria necessário. Em alguns casos, este desmultiplicar representa uma perda efectiva na liberdade e funcionalidade das tecnologias de informação que adquirimos.

Precisar de mais para, aparentemente, fazer o mesmo, é um percurso perigoso no qual deixamos de ser donos de equipamentos com capacidades computacionais, para passarmos apenas a arrendar plataformas que nos permitem usufruir dos serviços que procuramos. Serviços esses que podem deixar de existir, simplesmente, porque uma das muitas camadas pelos quais são constituídos, deixou de ser comercialmente rentável.

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Se não pensares nisso, alguém vai fazer-lo por ti.
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