CSAM, “falsos positivos” e outras histórias

Por: Pedro Aniceto
Tempo de leitura: 3 min
Laurenz Heymann/Unsplash

Faz algum tempo que não se registava um alerta de tsunami na costa da Apple, mas creio bem que um já tenha sido activado e que as ondas de choque já se fizeram sentir. Falo do CSAM (Child Sexual Abuse Material), uma tecnologia que a Apple decidiu explorar para identificar casos de imagens de conteúdo infantil sexualmente abusivo. Há inúmeras bandeiras levantadas a respeito deste assunto. A essência do objectivo é correcta, nobre e certa, mas a ideia de ter o conteúdo dos nossos aparelhos observado não é confortável nem para o mais liberal dos utilizadores. E se a ideia da observação de conteúdo privado já é incomodativa quanto baste, a ideia de o ver reportado às autoridades por um qualquer Big Brother parece-me ainda mais perigosa.

A Apple, defensora em teoria das questões basilares da privacidade, pisou aqui uma linha que gerará um intenso debate, que aliás já é público e notório. Edward Snowden foi, porventura, a mais mediática das vozes contra e coloca questões que farão pensar mesmo o mais distraído dos utilizadores. «Esta tecnologia de scan dos nossos aparelhos, que hoje é destinada ao conteúdo de abuso sexual de menores, pode amanhã, com um simples premir de uma tecla, ser redireccionada para outras áreas. A coberto da capa da luta anti-terrorista, outras vigilâncias podem muito facilmente ocorrer». Sim, é verdade que um governo totalitário que tenha acesso a algo deste género em termos tecnológicos, fará disto um festim. É, e é a minha opinião pessoal, uma das tecnologias mais potencialmente perversas que a Apple já terá concebido. E eu não sou propriamente o mais fanático campeão da privacidade em termos de sociedade de informação.

Obviamente que a Apple já sentiu o clamor e tem produzido material de marketing e informação, numa cadência e quantidade que não é comparável ao pré-anúncio de qualquer outra tecnologia. Mas mesmo eu, ardoroso fã de Cupertino, tenho as mais sinceras dúvidas sobre o dano que esta decisão vai ter sobre o mercado, numa época em que os consumidores mais parecem banhistas a tentar defender a sua toalha da subida da maré, no que à constante invasão de privacidade diz respeito. Mas aguardemos. O mercado ainda é dono e senhor das suas escolhas.

 

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